sábado, 23 de fevereiro de 2013

Reencontro

Com cautela subiu os três degraus da pequena escada.
Na parte de cima do armário encontrou calças, camisas, casacos.
Ao fundo, o espelho.
Sorriu.
Nunca mais ficaria tanto tempo longe de si.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Mãe

Mãe
Há algum tempo a escrevi um email. Falava de minhas angústias, dúvidas e cansaços. Ela me respondeu com parte de sua história. Naquela resposta percebi que ela continuava sendo a pessoa que mais sabia de mim (mesmo quando não falamos sobre os fatos) e que sua vida é toda cheia das respostas que busco. Naquele email ela me reafirmava a possibilidade da gente se reinventar sempre. Quanto conforto.
Minha mãe tem lá seus defeitos. Alguns - como o exagero - chegam a ser engraçados. Mas ela é cheia de coisas admiráveis. Adoro o fato dela não ser sofrenilda. A vida reserva muitas coisas boas para todos. E outras tantas ruins. Minha mãe supervaloriza as boas e menospreza as ruins. Adoro isso. Assim como adoro a coragem com que ela solenemente ignora a Opinião dos outros sobre ela e seus amores. Amores podem ser lenços e lápis coloridos de olhos ou maridos. Adoro! Adoro a almôndega dela, na versão regime (com ricota) ou na versão tradicional (fritas com salsinha). Adoro quando ela pede o seu mamá (uma taça de vinho) ou quando ela aparece toda mulambenta indo caminhar. Adoro saber que ela tem um violão no gabinete de trabalho. Adoro saber que ela juntava todo o dinheiro para fazer festa de aniversario com gelatinas em copos plásticos para um de seus cinco filhos. Adoro rir com ela do dia em que chamei os enfermeiros para a interditarem num hospital (ela estava me irritando!). Adoro chorar lembrando quando, com poucos anos, a disse que nao ia morrer daquela vez (numa das pneumonias que tive). Adoro lembrar que íamos juntas passear no Guion e achavam que nós éramos um casal. E que juntas odiamos muitos filmes. Adoro o ódio que minha mãe tem de intelectualóides. Adoro quando ela toca piano ou violão. E adoro quando vejo a isa a chamando de vovó. Adoro saber que numa simples mensagem de texto ou email, minha mãe segue me dando o maior abraço do mundo. Como quando eu ainda era criança e a esperava chorando de suas aulas na faculdade. Como quando eu me perdi e ela subiu na pedra e gritou até toda cidade saber que uma criança estava perdida. E me encontrar. Aquele abraço, daquela tarde em que me perdi com cinco anos, minha mãe me dá sempre.
Feliz aniversário mamãe. Te amo.


Há um Ano escrevi esse texto. Ele ainda diz o que sinto. Dirá para sempre.
Texto publicado em 19/02/2012

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Certeza

já pensaste que outra será a mãe dos teus filhos?
tens certeza do que estás fazendo?
Essa é a última vez que te procuro,
o último sábado,
a última chance.
Grita, desesperado.

Não tenho certeza de nada.
fala com a calma dos que já morreram quase tudo.
Mas quando eu te amava, tinha.

Faz falta

Gostas tanto de ti
que
não me precisas,
por isso,
sobro.
Sobro
porque em ti,
pra ti,
não falta nada,
e em mim,
pra mim,
falta muito.
E aí
perdemos a graça,
perdemos o tom.
E é tão bom quanto tem graça,
quando faz falta,
quanto fazemos falta,
Quando falta.
faz sentido.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Berlim

Parece que será para sempre como essa cidade bombardeada: acordar e dormir sendo reconstruída para tentar esquecer que um dia foi perfeito,
Que um dia houve uma casa para a qual voltava e perguntava como foi o dia com vontade de saber,
E contava o dia com vontade de contar como foi o dia.

Parece para sempre haverá
um muro
Um passaporte.
Um carimbo.
Um lado para se escolher,
Uma guerra para se travar.

Para que não se esqueça,
Para que não se repita,
dizem os judeus.

sábado, 9 de fevereiro de 2013

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Sobre loucas e santas

Gritaste: "louca!"
fiquei parada.
Não entendeste nada!
Achaste que poderias humilhar sempre,
Até mesmo em público.
apenas te achei frágil,
são frágeis os que precisam ofender.

Depois,
A louca não era eu.
A louca era a que tomas por santa.
E a santa contou, envolveu, expôs, machucou quem não devia:
Escândalo, vulgaridade, baixaria.
Não lembras.
Nunca lembras.
Errei novamente, permiti.
E a santa pautou a vida.

pauta a tua vida.
Pobre santa!
Com seu manto,
Abandonada,
Sofrida.
Envelhecida.

Equivocadamente aceitei dividir a mesa
Com a santidade que é tua.
Não minha.
Jamais deveria ter ido ao culto.
Por que fui?

Depois, acreditavas que podias qualquer coisa.
Oraste por tua fé em Meu altar.
Não te pedi para sair da igreja.
Não sei o porquê.
Faltou fé.
Faltou força.

Agora, Cansada disso tudo.
Chutei a imagem da santa.
Oca.
Recheada de ouro,
Como eram aquelas carregadas pelos portugueses nos idos de 1500!
Santa do pau oco.

Tu, assustado,
Decidiste punir quem chutou.
Sempre é mais simples.

Isso. Tira o sofá da sala.

Quantos sofás já trocaste por essa santa?







Bingo.

Tu estás certo,
Coberto de razão,
Como eram cobertos de chocolate
os bolos das festas infantis.
Eu não deveria ter feito
Nada daquilo..
Não.
Jamais poderia ter escrito tudo o que sentia.
Era um dia tão importante para ti!
Como a véspera, o Natal, o ano-novo e todos os últimos dias de sempre...
Como me dei o direito de existir num
Mundo em que apenas tu existes?
Afinal,
Se não suporto o peso de viver no teu mundo...
O melhor é sair dele.
Bingo.


quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Cansada

Intoxicação por chumbo ou mercúrio,
sei lá.
Dessas que não acontecem em um único dia.
Dizem que as pessoas passam anos expostas até adoecerem.
Não é a doença de um fato.
É a doença de um todo.

A tortura da gota d'água.
Aquela que trancam alguém numa peça.
Sem choques ou pau de arara.
E a enlouquecem com o barulho constante, regular, inalterável da gota de água.

Assim fizeste comigo.

Solidão

Desistimos,
um por um de ti.
Desistemos de tocar,
de falar.

Percebo que foi ela
quem cansou desse olhar
que julga,
obliquo.
Foi ela quem,
Por fim,
mesmo sofrendo,
bateu a porta.
Cansada da grosseria,
"do saber tudo".

rei-sol,
centro do mundo,
mundo que gira ao redor.

Não foste tu quem escolheu a solidão,
Percebo,
Quase tardiamente.
Foi ela quem te escolheu.
E temo que seja a única que não canse de ti.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Tempo

Podes dar tempo ao tempo?
Gritas, como quem é o senhor de uma razão antiga.
Sim,
Tens um tempo infinito.
O tempo de tua vida inteira.
Não da minha.

Entendo hoje a pergunta feita há algum tempo atrás.
Não tenho muito o que fazer aqui.
Não desfizeste o armário,
Manténs o porta-retrato,
Os papéis,
Lençol e documentos.

Queres tudo no teu tempo!
Gritas, novamente dono da razão antiga, mesmo que eu apenas falasse, como há muito não o fazia.
Não. Não quero nada no meu tempo.
Eu apenas quero viver a vida no tempo presente.

Sem o passado de ninguém na minha volta.







segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Oco

Naquela noite
- Longe -
um filme de terror virava realidade.

Na porta de um edifício.
Roupas de bebê eram postas no lixo.
Brancas, sonhadas, Cortadas.

Naquela noite ele desejou que fosse oco o útero dela como oco, dizia, era o coracão.

Naquela noite, ele comia peixe, via a lua, ria da vida.

Na manhã seguinte,

mães procuravam - desesperadas - aos filhos.

Ela levava o filho dela.
Dele.
A mãe dele.
Sentiam medo.

Ela sentia medo.

Oco.
Não tardou ao ouvir o som.

O coracão oco.
Dele.


Alma

Amanhece.

Sinto o corpo que é só meu e agradeço o gosto Salgado que escorre de meus olhos.

Meses atrás, Quando a pele começou a cair, assustei!
Corri para tirar os espelhos da casa.

Hoje, foram tantas as mutações pelas quais passei que já não me espanto.

A alma não reflete em espelho nenhum. Às vezes, machucada, sangra pelos olhos.

domingo, 3 de fevereiro de 2013

Venceste

Quem não responde a uma carta de amor,
Quem deixa o eu te amo no ar,
Quem não perdoa o erro - que também era seu - e faz chorar,
Não quer mais o brilho no olhar,
O espontâneo querer,
O cuidar gratuito.
Quem silencia orgulhosamente,
Quer ser livre.

Ok.
You win.
Me voy.
Adiós.




Não creio

Acreditei que entre nós as coisas fizessem sentido.

Acreditei, de verdade.

foram tantas vezes que tu falaste o que eu pensava,
Tantas vezes que marcamos cinco pontos no "stop",
Tantas vezes que a gente pediu a mesma comida,
Quis ver o mesmo filme,
Brigou a mesma briga
que acreditei que entre nós as coisas fizessem sentido.

porque um dia escrevi um poema sobre uma campainha e tu entendeste!
disseste que estavas do meu lado da porta.

O que fazer?
sou mesmo assim.

acredito que posso mudar o mundo,
Embora tu aches que não consiga mudar a mim mesma...

Acredito em sorrisos verdadeiros,
Embora, às vezes, eu mesma sorria apenas para trancar o choro.

Ah! Quantas fotos com sorrisos que trancam o choro já saíram em capas de jornais?

Um dia, mais cedo ou mais tarde, o sorriso voltará a ser verdadeiro.
O mundo terá mudado.
E talvez eu mude também.
acredito.

Até lá,
Marco dez pontos no stop,
Nem penso para não me perder de mim,
Não brigo,
Não como,
Não creio.
Escrevo.


sábado, 2 de fevereiro de 2013

Teu silêncio

No primeiro dia,
teu silêncio me fez vomitar.
Chorei por um dia e uma noite.
Contei os segundos, os minutos.
dormi e acordei sem acreditar que ainda estavas quieto,
que me mantinhas no cativeiro,
Desvendei "o segredo de teus olhos".

Lembrei de antes,
do que te escrevi,
Do pedido de desculpas,
Do choro compulsivo,
Da mensagem sem Resposta.
Da resposta em que tu me empurravas do precipício,
Com a maldade das palavras:
"Estas doente".
Lembrei que naquele dia, gritando,
apaguei tuas fotos,
Teus rastros,
Que esfreguei a pele,
para tirar aquilo que de ti está tatuado em mim.

No segundo dia,
Chorei, escrevi, escrevi, expliquei, me expliquei, me expus, desvendei, fiquei nua.
Continuaste quieto.
Disse que te amava.
Tu?
Decidiste pegar a faca e cortar fino,
Parte por parte de tudo o que sinto por ti.

Depois,
Senti vergonha de mim.
De ter sentido isso tudo.
Agora,
Aprendi que amor demais não é problema.
Problema é amor de menos.

E de amor de menos, eu, ao menos, não sofro.




Nada

Queria que sentisses raiva de mim,
Aquela raiva que sentimos quando somos traídos.
A raiva que nos faz, por uma fração de segundos,
sermos capazes de apertar o gatilho, tomar o veneno,
chegarmos à júri popular.

Podias talvez sentir nojo,
O nojo de imaginar teres tocado na pele suja de um suor que não era o teu.
O Nojo do cheiro de cigarro impregnado na roupa, nojo do sorriso dado para outra pessoa fotografar.

Ou saudade.
Falta da presença constante,
Moribunda,
Saudade Do olhar que te segue,
admira e deseja.
Podias sentir saudade do abraço, do cheiro, de qualquer coisa.

Mas não sentes Nada.
Nada disso.
és indiferente.
Não sentes
Raiva,
Nojo,
Saudade.
Não sentes nada.
Nada.



sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

De mais nada.

Nada.
Não precisas de mais nada, dizes.
Machucas,
Feito fagulha,
Pedaço de Madeira miúda,
Doída,
Faca que mutila,
Papel que corta ardido,
Dizes que não precisas de mais nada.
Mostras teu gosto amargo da vingança,
Apenas pra me ver no canto,
Feito bicho,
Acuado,
Sangrando,
Gemendo,
Arrependida.

Muito.
Preciso de muito.
Preciso de braços.
Preciso de abraços.
Calor,
Amor,
Vida.

Aeroporto

Desembarquei e não me esperavas no aeroporto como tantas outras vezes.
Desci acompanhada dos meus medos que me deixaram sozinha.